AS LENDAS DO RIO SÃO FRANCISCO.
Honorato Ribeiro dos Santos.
Quando o Brasil foi descoberto
Vieram os povos europeus
Também vieram africanos
Como escravo, quanto sofreu!
Mas deixaram na nossa história
Bastante lenda que nos deu.
Nas margens do São Francisco
Existem muitas cidades
Todas elas têm suas lendas
Que contam velhos de idade
Eles contam e acreditam
Dizendo-nos que são verdades.
Dizem que rio São Francisco
Contam os velhos do passado
Que existe o compadre d água
Que pega pessoa a nado
Mesmo dentro da canoa
Ele atrai o cabra apertado.
Dizem que ele se transforma
Em tudo que ele quiser
Transforma numa cabaça
Pra pegar quem ele quer
Tem dentes brancos e afiados
Come tudo o que puder.
A sua cabeça é pelada
Nariz grande qual taboca,
As presas de caititu
Vive debaixo da loca
Os pés e mãos quais de pato
Ligeiro como uma foca.
Pescador do São Francisco
Que vive só de pescar
Fala com afirmação
Que o compadre quis pegar
Há do preto e sarará
Quem o ver vai assombrar.
Estes foram os caracteres
Do compadre qual proteu
Que no rio do São Francisco
Muitos casos já se deu
Agora conto outra estória
Pra quem ler, pra quem já leu .
É a estória do lobisomem
Que aparece à escuridão
É um cachorro muito grande
Que faz a sua assombração
Que aparece às sextas-feiras
À meia-noite qual ladrão.
Dizem que o pai de família
Que tem sete filhos homens
À meia-noite o caçula
Se transforma em lobisomem
Qual uma metamorfose
Qual antropófago ele come.
Pra acabar com o mistério
Batiza logo o caçula
O irmão mais velho é o padrinho
E o fenômeno se anula
Não vira mais lobisomem
Quebrando toda sua jura.
Pra virar-se lobisomem
Tem que enrolar num borralho
Depois logo se transforma
Sai em busca de um galho
Para agarrar com segurança
Qual lobo faminto em faro.
Nas ruas, becos da cidade
As noites de escuridão
A gente não sai sozinha
Com medo do cachorrão.
Existem muitas cidades
Que não têm iluminação.
Há também outras estórias
Que agora vou lhes contar
Mulher que amiga com padre
Nas sextas-feiras vai assombrar
É a tal mula-semm-cabeça
À noite vem sempre atacar.
Com a cabeça entre as pernas
Ruma coices pra matar
A pessoa quando lhe encontra
Para ela não lhe atacar
Tem que esconder suas unhas
Pra que dela se livrar.
O padre tem que rezar
Para fazer a excomunhão
Quando for celebrar missa
Sexta-feira da Paixão
A tal mulher vira mula
Sai fazendo assombração.
Existe aqui o bicho homem
Não no rio e sim na mata
É um super-homem feroz
A quem encontrar ataca
Pra comer quem ele agarra
Pega logo pra almoçar.
É um gigante de três metros
Seu urro parece um trovão
Só tem um olho na testa
Unhas longas qual gavião.
Seus cabelos são compridos
Tem força como Sansão.
As pessoas que vão à mata
Profissão de caçador
De meia légua ouve-se o ronco
Bicho homem matador
Até os cachorros de caça
Murcham rabo, o abanador.
Mulheres que pegam lenhas,
Homem meleiro e lenhador
Todos ficam assombrados
Quando virem, que horror!
Voltam-se apavorados
Quando turra dá pavor.
Certa vez um caçador
Com seus cachorros de caça
Foi com seu amigo e compadre
Com cabaça d água e raça.
Chegando a certo lugar
Se separaram com graça.
Despediram-se e partiram
Cada um para seu lugar
Depois, tudo combinado
Pra em tal hora se encontrar
Mas, quando foi a hora exata
Faltou o compadre chegar.
Pois chega de cabo murcho
Os cachorros, fiéis amigos.
O bicho pegou o compadre
Matando-o e já espremido
Na copa da barriguda
Ele avistou o inimigo.
Com seu compadre debaixo
Do braço, calmo a comer.
Dando urros que tremia tudo
Toda a mata a si estremecer.
O caçador só não morreu
Porque Deus foi quem valeu.
Voltou correndo qual louco
Nunca mais ele quis caçar
Contou o que ele tinha visto
Pouco quis lhe acreditar
Mas quando viram o rastro
Donde o caçador foi mostrar.
Todos ficaram pasmados
Quando viram rastro no chão
Sinal de sangue espalhado
Do compadre, seu irmão
Mas não encontraram o bicho
Voltaram sem solução.
Contarei agora a estória
Muitos contam da serpente
Vive no fundo do rio
Metendo medo a muita gente.
Dizem que está criando asas
Tem que rezar todo crente.
Se não rezar cria asas
E arrasará sete cidades...
De uma vez só com seu turro
E voa com velocidade
Terão que rezar o ofício
Da Virgem da Caridade.
Cada dia rezam o ofício
E as penas têm que cair
Isso é grande devoção
À Nossa Mamãe pedir
Pra serpente não criar asas.
Pra seu turro não se ouvir.
Ela é moradora eterna
Nos portos e no paredão
Das cidades ribeirinhas
No buraco, caldeirão
Só não sai pra ninguém ver
Porque não criou asas não.
Havia um casal feliz
Morava numa fazenda
Mas, quando foi um belo dia
Surgiu querendo merenda
Um gato bastante lindo
De invejar sem ter arenga.
Disse o marido à mulher:
Esse gato vamos criar!
Porque aqui nós precisamos
Tem rato pra ele pegar.
Cuide dele como gente
Quando eu tiver que viajar.
Quando marido viajava
O gato sumia de casa...
Quando o marido chegava
O gato de mansinho entrava
Magro e fino como uma linha
De tão fraco ele não miava.
O marido revoltado
Disse logo pra mulher:
No dia que eu for viajar
E você assim não fizer
Cuidar, zelar do gatinho,
Eu juro, lhe mato até...
Mas, marido, toda vez
Que esteve de mim ausente
O gato some daqui!...
Ele não gosta da gente!
E talvez não me acredite
Porque você não é crente.
Faça carinho no gato
Como tenho feito sempre
Senão a promessa eu cumpro...
Cuide bem do gato, lembre...
Senão eu vou ter que cumprir
O que eu disse a você na frente.
O marido viajou
E o seu gato se escondeu
A mulher fez o possível
Mas o gato não comeu;
Não adiantava de nada
E ele desapareceu.
Não comia nada, nada
Pra depois emagrecer
Pois o gato assim queria
Ver bem a mulher morrer
Mas isso não aconteceu
Porque Deus veio lhe valer.
O marido ia viajando
Pousou numa gameleira
Onde houve uma audiência
Dos demônios nessa eira.
Como ele estava cansado
Foi deitar na sua esteira.
De sono leve em madorna
Ouviu-se voz que bradava
Dizia: Diz, que está fazendo?
Era o chefão da palavra.
-Atentei um pra matar outro...
-Eu enlouqueci um que matava...
-E você aí que tem feito?
-Eu estou atentando um casal.
Transformei num lindo gato
Num pequeno arraial.
Finjo que estou morto de fome
Pra fazer meu vendaval.
O marido prometeu
Matar assim sua mulher
Quando ele voltar da viagem
Se me encontrar fraco até
De fome?...Ela não escapa!
Só volto lá quando ele vier.
O marido na madorna
Ficou ciente da cilada
Que o gato estava fazendo
E preparou logo a paulada.
Com muito medo a mulher
Ao marido ela explicava...
Nisso o gato aproximou
Magricela e dando miau...
O homem fez que não sabia
E no gato meteu o pau.
Pipocou na mesma hora
Subiu enxofre o coxo mau.
Ó mulher! Disse o marido:
Esse gato era o diabo
Queria que eu lhe matasse
E ele mostrou logo o rabo
Viveremos sempre juntos
Amando-a sempre e amado.
Vocês ouviram contar
Do vaqueiro Borges, falado?
Que montava na égua magra
Mas veloz que um veado?
Fazia coisas estranhas
Até em onça era transformado.
Ele tinha um companheiro
Que andava sempre com ele
Todo mundo afirmava
Que era discípulo dele.
Só andava ambos no mato
Pois ambos eram vaqueiros.
Começou a sumir o gado
Nas fazendas dos herdeiros
Onde o Borges sempre estava
Seu trabalho de vaqueiro
Ele e o seu colega foram
Descobrir o paradeiro.
Da onça que pegava o gado
Já com três dias no seu pé.
Com fome e fraco estavam
Eu vou dar um jeito, Zé...
Vou revelar um segredo
Precisa coragem e fé.
Vou-me transformar numa onça
Pegarei o boi pra comer
Você segura essa folha
Que nada irá acontecer,
Quando eu matar o boi eu venho
Pra bem perto de você.
Põe essa folha em minha boca
Eu viro gente de novo;
Nós vamos comer a carne
E vamos contar o povo
Ninguém saberá que foi eu.
Você não grita, socorro!
Borges transformou em onça
Agarrou o boi e o sangrou
Veio correndo para o Zé
Quando viu se apavorou...
Correu sumindo de medo
E a todo o povo ele contou.
Borges não virou mais gente
Ficou no mato e se escondeu
Todo povo bem armado
E na onça bala meteu
Meteram bala e a mataram
Deu um suspiro e assim morreu.
Diz o povo que assistiu
Que o gemido foi de gente
Quando ela olhou para o Zé
Você foi muito descrente!
O mistério da onça Borges
Até hoje o povo é crente.
No Vale do São Francisco
Há muitas lendas desse tipo.
Muita gente conta e crer
Outros dizem que isso é mito...
Mistérios são revelados
Tantos os outros como cito.
Daqui há duzentos anos,
Quando a ciência progredir
Vai explicar tudo que é certo
Quando vir e descobrir
Fenômenos existentes
Aparecem vão descobrir.
Nossa mente é capaz
Projetar imagem vista
Muitos dizem ser fantasmas
E colocam em revistas.
Tem quem faz muito prodígio
Pela força da mente à vista.
Uma história vou contar
Pra vocês com exatidão
Um filho bem malcriado
Com tamanha ingratidão
Fez calúnia à própria mãe
Batizado de Romão.
Mas o povo lhe chamava
Não Romão, mas Romãozinho.
O pai era bom lavrador
Com a mãe ficou sozinho
Pra levar comida ao pai
Pro pai ele era i filhinho.
Mas um dia a sua mãe
Mandou-o levar a comida
Pro pai na roça distante
Romãozinho foi e na ida...
Comeu toda da galinha
Deixando os ossos qual jazida.
Levou pro pai tão faminto
Entregou sem coração...
Quando o pai tirou o pano
Viu os ossos, comida não!...
Cadê a comida, menino?!
Esses ossos, como, não!
A comida mãe comeu
Com os homens a farrear...
Que absurdo Romãozinho!
Não me conta! Vou vingar...
E saiu fulo de raiva
Para bater e espancar.
Com o chicote de cavalo
Bateu forte na mulher
Ela sem saber de nada
Só estava com a colher
Que havia almoçado
Gritou-lhe: Que é isso, Zé?!
Você é uma safada
Descarada sem vergonha!
Comeu toda a minha comida
Mandou os ossos, sua pomonha...
Pra mim comer lá na roça
Você aqui com os machos, Sonha!...
Quem lhe disse esse absurdo?!
Romãozinho, o filho seu!
Menino, caluniando!
A sua mãe, seu bem querer?!
Foi, eu vi, disse o menino,
Romãozinho sustentou.
A mãe que era inocente
Uma praga lhe rogou:
Romãozinho vai pro inferno!
Vai ser grande tentador.
Ele sumiu no mundo
E os diabos o acompanhou.
Virou um cão dos infernos
Tentando uns aqui e acolá
Comida no fogo pronta
Jogava fora pra lá
O povo ficou com fome
Chamou o padre pra rezar.
O povo todo assombrado
Com Romãozinho em ação.
O povo rezava o ofício
Da Mãe de Deus com aflição
Ele não se importava
Respondia com razão:
Eu aprendi também rezar
Minha mãe quem me ensinou,
Mas agora sou o diabo
Pois ela me espraguejou
Porque lhe fiz uma calúnia
E meu pai me acreditou.
Mas aí vem o vigário
.para missa celebrar
E jogar a água benta
Para eu me afastar
Meus irmãos já me falou
Que não gostam de rezar.
Ele ficou invisível
Ninguém via o condenado
O povo do São Francisco
Já vivia assombrado
Com o tal de Romãozinho
Aqui fica registrado.
Poesia de Honorato Ribeiro dos Santos
Grande mestre Honorato.
ResponderEliminarLindo poema, parabéns professor!
http://jotavieiraescultor01.blogspot.com.br/
O mestre é o melhor!
EliminarObrigada pela visitinha, seja sempre bem vindo.